Política / Cidadania
Consciência Negra: ALEMS reforça compromisso com igualdade racial e valorização da cultura afro-brasileira
Parlamento destaca legislações, dados sobre quilombolas, ações permanentes e vozes que constroem a agenda antirracista em Mato Grosso do Sul
20/11/2025
06:45
DA REDAÇÃO
©FRANCISCO BRITTO
No Dia da Consciência Negra, celebrado nesta quinta-feira (20), a Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul (ALEMS) reafirma o compromisso histórico com a luta antirracista, a valorização da população negra e a defesa de políticas públicas estruturantes. Há 18 anos, a Lei Estadual 3.318/2006, de autoria do saudoso deputado Amarildo Cruz, instituiu a data no calendário oficial e se tornou marco da memória, da resistência e da continuidade histórica da população afro-brasileira no Estado.
Desde então, iniciativas legislativas, debates permanentes e ações educativas têm sido ampliadas dentro e fora do Parlamento. Entre elas, o especial “ALEMS Antirracista”, criado em 2021 e atualizado neste mês, que reúne análises, legislações, produções culturais e um manual de práticas antirracistas de referência estadual.
A história negra sul-mato-grossense se manifesta de forma viva nos territórios que resistem. Um dos mais emblemáticos é a Comunidade Negra Tia Eva, fundada em 1905 por uma mulher liberta que dedicou sua vida ao acolhimento de outras pessoas negras. Seu legado espiritual e comunitário tornou-se símbolo da ancestralidade no Centro-Oeste.
Dados do Censo 2022 do IBGE revelam que:
Mato Grosso do Sul possui 2.572 pessoas quilombolas, equivalente a 0,09% da população do Estado;
1.401 quilombolas vivem fora dos 11 territórios oficialmente delimitados, indicando forte presença urbana dispersa;
O Estado tem o 2º maior índice do País de quilombolas vivendo em áreas urbanas dentro dos territórios reconhecidos (28,20%), atrás apenas de Sergipe.
Entre os territórios identificados estão Tia Eva, Furnas do Dionísio, Colônia São Miguel, Chácara Buriti, Picadinha, entre outros. Para pesquisadores e movimentos sociais, esses dados reforçam a diversidade da experiência quilombola — que atravessa tanto a terra tradicional quanto a cidade contemporânea.
O presidente da Comissão de Educação, Cultura e Desporto da ALEMS, deputado Professor Rinaldo Modesto (Podemos), destaca que a mudança estrutural depende da escola. Ele reforça a importância do cumprimento das Leis 10.639/2003 e 11.645/2008, que tornam obrigatória a abordagem da história e cultura afro-brasileira, africana e indígena — ainda pouco implementadas no país.
O especial “ALEMS Antirracista” reúne dados nacionais que evidenciam a urgência desse enfrentamento:
55,4% da população brasileira é negra;
69,2% das pessoas que recebem até um salário mínimo não concluíram os estudos;
Desigualdade de renda e escolaridade afeta de forma mais intensa pretos e pardos.
Para Modesto, o debate racial não pode se restringir a datas comemorativas:
“A escola precisa incorporar de forma permanente o debate sobre raça e diversidade na rotina pedagógica”.
Ele também destaca que a cultura negra sul-mato-grossense segue produzindo, criando e resistindo, embora ainda enfrente desafios de visibilidade e acesso a editais, espaços e políticas culturais.
À frente da Comissão de Trabalho, Cidadania e Direitos Humanos, o deputado Lidio Lopes (sem partido) ressalta que o combate ao racismo exige articulação institucional, canais de denúncia fortalecidos e políticas públicas continuadas. Os números mostram o tamanho do desafio:
75% das pessoas abaixo da linha da pobreza são negras;
63% dos desocupados no país são pretos ou pardos;
Informalidade atinge 46,8% das mulheres negras e 46,6% dos homens negros;
Mesmo com nível superior completo, pessoas brancas ganham 45% a mais por hora do que pessoas negras na mesma função.
Lidio alerta para o avanço das agressões nas redes sociais, onde o anonimato favorece reincidência:
“O Parlamento precisa garantir visibilidade às denúncias e fortalecer a aplicação da lei”.
A professora e pesquisadora da UEMS, Cíntia Diallo, referência nacional em estudos étnico-raciais, reforça que as desigualdades atravessam múltiplas esferas: estrutural, institucional, religiosa, ambiental e recreativa.
Os dados nacionais são alarmantes:
76,5% das vítimas de homicídio no Brasil em 2022 eram negras;
A taxa de violência letal é 2,5 vezes maior que entre não negros;
84,1% das mortes por intervenção policial têm pessoas negras como vítimas;
66,4% das mulheres assassinadas são negras.
Para Diallo, políticas eficazes dependem de reconhecer essas camadas e assegurar ações afirmativas, estética negra valorizada, titulação de terras quilombolas e oportunidades profissionais reais:
“Não basta reconhecer o racismo — é preciso se posicionar.”
A legislação brasileira estabelece diferenças importantes:
Racismo (Lei 7.716/1989): crime imprescritível e inafiançável, quando dirigido a grupo por raça, cor ou etnia.
Injúria racial (Lei 14.532/2023): ofensa individual por elementos raciais — agora equiparada ao racismo, com pena de 2 a 5 anos de reclusão, sem fiança.
Entre as leis estaduais já aprovadas e citadas no especial “ALEMS Antirracista”, destacam-se:
Lei 6.206/2024 (Mara Caseiro) – Estatuto da Mulher Parlamentar
Lei 5.388/2019 (Pedro Kemp) – Sanções administrativas por discriminação racial
Lei 5.254/2018 (Renato Câmara) – Dia Estadual das Mulheres Negras Latino-Americanas
Leis de Amarildo Cruz:
Cadastro de Condenados por Racismo (5.216/2018)
Dia do Orgulho Crespo (5.206/2018)
Alterações na Lei dos Cultos Afro-Brasileiros (5.094/2017)
Medidas de combate ao racismo (3.926/2010)
Cotas em concursos públicos (3.594/2008)
Instituição do Dia da Consciência Negra em MS (3.318/2006)
Lei 2.605/2003 (Pedro Kemp) – Reserva de 20% das vagas na UEMS para estudantes negros
A presidente do Fórum Permanente de Entidades do Movimento Negro de MS, Romilda Pizani, reforça que a formação continuada é central no combate ao racismo. Ela aponta entraves na implementação da Lei 10.639/2003 e mitos racistas que associam conteúdos afro-brasileiros à religião.
Os dados eleitorais indicam avanços e desigualdades:
52% dos candidatos em 2024 se declararam pretos ou pardos;
Apenas 23,08% dos prefeitos eleitos nas capitais são negros;
Vereadores negros eleitos: 26.789 (45,86%);
No Congresso (2022), pretos e pardos somaram 26,12% da Câmara.
Romilda destaca a ausência de pessoas negras em espaços de comando:
“Segurança pública não pode ser sinônimo de extermínio.”
A cantora e compositora Marta Cel traduz, em sua trajetória, a resistência cotidiana das artistas negras no Estado. Ela relata desvalorização, convites sem cachê e busca constante por espaços que valorizem sua formação, e não apenas sua presença estética.
Lembra ainda as palavras de Conceição Evaristo:
“Está na hora de parar de enxergar a existência do negro apenas como uma existência lúdica.”
Para a ALEMS, igualdade racial não é uma pauta de um dia — é projeto de Estado e de futuro. É reconhecer a memória, a resistência e a contribuição de quilombolas, artistas, pesquisadores, trabalhadores, professores e lideranças sociais que constroem Mato Grosso do Sul.
A data reforça que memória não é retorno: é impulso.
É dela que se constrói o amanhã.
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